Brasília, 10 de dezembro de 2025 – Em uma sessão tensa e marcada por protestos da base governista, a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quarta-feira (10) o Projeto de Lei da Dosimetria (PL 2.162/2023), que altera o cálculo de penas para crimes relacionados aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e à tentativa de golpe de Estado. A medida beneficia diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 27 anos e três meses de prisão, podendo reduzir o tempo em regime fechado para cerca de 2 anos e 4 meses, segundo projeções do relator.
O texto-base passou com 291 votos favoráveis e 148 contrários, após uma noite de debates acalorados e rejeição de todas as emendas apresentadas pela oposição ao governo Lula. Parlamentares do PT, PSOL e PCdoB tentaram barrar trechos que unificam penas por crimes como tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, mas foram derrotados. “Isso é uma vergonha para a democracia. Estamos premiando golpistas”, criticou a deputada Maria do Rosário (PT-RS) durante a sessão.
O que muda com o PL da Dosimetria?
Apresentado como uma alternativa à anistia ampla, inicialmente defendida pelos bolsonaristas, o projeto estabelece regras mais brandas para a progressão de regime e remição de pena. Principais pontos:
- Unificação de crimes: Quando golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito são cometidos no mesmo contexto, aplica-se apenas a pena mais grave (de 4 a 12 anos), em vez da soma das duas. No caso de Bolsonaro, isso cortaria cerca de 6 anos e 6 meses da condenação original.
- Redução por contexto de multidão: Para participantes dos atos de 8 de janeiro, as penas podem ser diminuídas em 1/3 a 2/3, desde que não haja financiamento ou liderança direta no crime.
- Progressão facilitada: Prisão em regime fechado cai para 1/6 da pena (em vez de 1/4), permitindo saída para semiaberto após cumprimento inicial reduzido. Para Bolsonaro, isso poderia ocorrer em cerca de 3 anos e 6 meses totais.
- Remição por trabalho e estudo: Dias em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica contam para abatimento – a cada três dias de atividade, um é descontado. Bolsonaro, que cumpriu domiciliar de agosto a novembro de 2025, se beneficiaria diretamente.
De acordo com o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do projeto, a proposta foi elaborada por “juristas renomados” e discutida com o STF, visando desestimular futuros ataques à democracia sem anular condenações. “Não é anistia. As pessoas vão continuar pagando, mas de forma mais justa”, defendeu ele.
Impacto para Bolsonaro: De 7 Anos para Menos de 3?
Atualmente preso na Superintendência da Polícia Federal em Brasília desde 25 de novembro, Bolsonaro tem uma projeção inicial de 7 anos e 8 meses em regime fechado, segundo a Vara de Execução Penal. Com o novo cálculo, isso despencaria para 2 anos e 3 meses a 2 anos e 4 meses, dependendo de interpretação judicial e de sua participação em atividades laborais ou educacionais na prisão. A pena total poderia cair para cerca de 20 anos, com liberdade condicional possível em 2037 – mas o ex-presidente completará 70 anos em março de 2026, o que já lhe garante benefícios etários.
O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), confirmou que Bolsonaro foi consultado via seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), e deu aval ao texto como um “ato de sacrifício” pelos condenados do 8 de janeiro. “É o possível, não o ideal”, admitiu o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que ainda pressiona por anistia irrestrita.
Reações: De Festa na Oposição a Vetos Prometidos
A aprovação gerou comemoração entre oposicionistas, mas revolta no governo. O presidente Lula, que pode sancionar ou vetar o texto, já sinalizou insatisfação. “Vamos analisar com cuidado. A democracia não pode ser negociada”, disse um assessor presidencial sob condição de anonimato. No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) prometeu votação ainda em 2025, antes do recesso. “Assim que chegar, coloco em pauta”, afirmou ele, pressionado pelo senador Marcos Rogério (PL-RO).
Críticos, como o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), acusam o centrão de barganha política. “Hugo Motta [Republicanos-PB, presidente da Câmara] pavimentou isso para blindar aliados”, disparou. Pesquisas recentes, como a do Datafolha em setembro, mostram que 54% dos brasileiros são contra qualquer perdão a Bolsonaro.
O STF, responsável pela execução final das penas, ainda não se manifestou. Especialistas preveem que o texto, se virar lei, terá retroatividade para beneficiar réus como o ex-presidente e seus ex-ministros, mas pode enfrentar contestações judiciais. Resta saber se essa “dosimetria branda” acalmará os ânimos ou inflamará o debate sobre impunidade no Brasil. O texto segue para o Senado, onde o destino da pena de Bolsonaro – e da memória do 8 de janeiro – será decidido.






