Brasília, 25 de novembro de 2025 – Em um movimento que aprofunda as fissuras entre o Legislativo e o Executivo, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou o rompimento de relações institucionais com o líder do PT na Casa, Lindbergh Farias (RJ). A decisão, confirmada nesta segunda-feira (24), reflete um clima de tensão crescente com o Palácio do Planalto, especialmente em meio a disputas sobre projetos de lei relacionados à segurança pública. O episódio não é isolado: representa o ápice de um desgaste que vem se acumulando desde o início do mandato de Motta na presidência da Câmara, eleito em fevereiro deste ano.
A ruptura com Lindbergh foi motivada por acusações de conduta “errática” do petista, que, segundo interlocutores de Motta, não cumpre promessas de articulação de votações. “Não tenho interesse em nenhuma relação”, declarou o deputado paraibano, em entrevista ao Metrópoles. Do outro lado, Lindbergh classificou a postura de Motta como “imatura”, em um sinal de que as trocas de farpas podem se estender a outros atores governistas. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), minimizou o impacto, afirmando que o episódio “não é uma crise com o governo”, mas analistas veem potencial para obstruir pautas prioritárias do Executivo, como reformas fiscais e medidas econômicas.
A Trajetória de um Político Precoce
Hugo Motta Wanderley da Nóbrega nasceu em 11 de setembro de 1989, em João Pessoa (PB), em berço de tradição política. Neto da ex-prefeita de Patos, Francisca Motta (MDB), e herdeiro de uma família influente no interior paraibano – com o avô Edivaldo Motta como ex-deputado federal e o tio como ex-prefeito –, Motta ingressou na vida pública ainda jovem. Formado em Medicina, ele abandonou temporariamente a carreira para se dedicar à política, filiado inicialmente ao PRB (atual Republicanos).
Sua ascensão foi meteórica. Aos 25 anos, em 2014, foi eleito deputado federal pela Paraíba com mais de 140 mil votos, tornando-se o parlamentar mais jovem da história da Câmara dos Deputados. No início do mandato, integrou a tropa de choque do então presidente da Casa, Eduardo Cunha (MDB-RJ), apoiando o processo de impeachment de Dilma Rousseff em 2016. Essa proximidade com o centrão o consolidou como articulador habilidoso, vice-líder de blocos partidários e relator de comissões chave.
Reeleito em 2018 e 2022, Motta acumulou experiência em pautas como saúde e infraestrutura, sempre com foco na base eleitoral paraibana. Em fevereiro de 2025, aos 35 anos, foi eleito presidente da Câmara para o biênio 2025-2026 com 444 votos – uma vitória de consenso que uniu governistas e oposicionistas, superando nomes como Arthur Lira (PP-AL). Foi, novamente, o mais jovem a ocupar o cargo, prometendo “equilíbrio na busca pelo consenso”.
Da Aliança com o Centrão à Erosão com Lula
A relação de Motta com os Executivos federais sempre foi pragmática, moldada pelo centrão. Durante o governo Michel Temer (2016-2018), ele foi aliado fiel, defendendo reformas como a trabalhista e a teto de gastos. No período de Jair Bolsonaro (2019-2022), manteve proximidade com o bolsonarismo, votando a favor de pautas conservadoras e criticando o STF em momentos de tensão – um traço que ressurgiu em 2025, ao contestar condenações relacionadas ao 8 de janeiro.
Com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva em 2023, Motta inicialmente se alinhou ao novo governo. Em 2024, foi visto como “favorito do Planalto” para suceder Lira, com acenos do Republicanos ao petismo para garantir a eleição na Câmara. Após a vitória em fevereiro de 2025, declarou “respeito” a Lula em entrevistas, e o partido celebrou a eleição como um “não adversário” ao Executivo.
No entanto, os atritos começaram a emergir no segundo semestre de 2025. A gota d’água foi o PL Antifacção, projeto de lei sobre segurança pública. Motta aprovou uma versão na Câmara que diluiu medidas duras contra o crime organizado, o que levou a críticas públicas de Lula, que chamou o texto de “fraco”. O episódio expôs divisões no centrão e abriu espaço para o bolsonarismo flertar com Motta, preocupando o Planalto. O rompimento com Lindbergh, aliado direto do governo, é visto como sintoma de uma crise mais ampla: a cúpula do Congresso, incluindo o presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), entra em “rota de colisão” com o Executivo por questões de articulação e verbas.
Desdobramentos: Um Congresso Mais Autônomo e Eleições à Vista
Os efeitos do rompimento podem reverberar rapidamente. Analistas preveem dificuldades para o governo aprovar propostas como o marco fiscal e ajustes no Orçamento de 2026, com o centrão exigindo mais contrapartidas. “O desgaste amplia a autonomia do Congresso”, avalia um interlocutor do Planalto, que teme obstruções em votações chave.
A longo prazo, o episódio fortalece a imagem de Motta como articulador independente, atraindo olhares para 2026 – ano em que ele pode disputar o Senado pela Paraíba ou até uma vaga no governo estadual. No entanto, o flerte com o bolsonarismo pode aliená-lo de Lula permanentemente, polarizando ainda mais o tabuleiro político. Se a crise se agravar, poderemos ver uma Câmara mais oposicionista, ecoando os embates de 2015.
Enquanto isso, o Planalto corre para recompor pontes. Uma reunião entre Lula e Motta é cogitada para os próximos dias, mas o tom de “imaturidade” trocado entre os líderes sugere que a reconciliação não será simples. Em Brasília, onde alianças são fluidas, o rompimento de hoje pode ser o prólogo de uma nova era de tensões institucionais.






